sábado, 21 de novembro de 2009

CONCEPÇÕES DA SEXUALIDADE HUMANA E RESPECTIVOS MODELOS DE EDUCAÇÃO SEXUAL

Falar em Sexualidade Humana, de um modo geral, e em Educação Sexual de um modo particular, significa defrontar-se com uma variedade de modelos e concepções; discursos, posturas ideológicas, filosofias e valores e vocabulários de usos comuns e significados diferentes.
Tais variedades prejudicam, dificultam e até mesmo impedem a elaboração e aplicação de um Modelo de Educação Sexual, não só em função do nível de condição histórica de conotação negativa e pejorativa que envolve a Sexualidade Humana, como pela ausência de um marco teórico sistematizado e carência de um referencial lingüístico coerente e adequado.


CONCEPÇÕES TRADICIONAIS

TRADICIONAL CLÁSSICO
Esta concepção vigorou por séculos na história ocidental. Fundamentou-se em bases ideológicas morais, religiosas e apoiou-se em conhecimentos pré-científicos. Em função da sua força na formação e desenvolvimento da nossa cultura, ainda se constata resquícios de sua presença na sociedade atual.
Considera a Sexualidade com um aspecto pouco importante da existência humana, reduzida à reprodução.
Fundamenta-se na concepção dualista e maniqueísta da pessoa humana: ser formado por alma (bem) e o corpo (mal).
A Sexualidade está envolvida por características peculiares, mágicas, transcendentais, o que lhe confere um ar misterioso e perigoso.
Principais características:
- Negação da existência do indivíduo como ser sexuado
- Manutenção de um código moral duplo (homem/mulher)
- Mulher assexuada
- Negação do prazer
- Considera a sexualidade como instinto perigoso, ameaçados, busca-se reprimi-la como forma de defesa contra impulsos sexuais.

MODELO DE EDUCAÇÃO SEXUAL
Para aqueles que admitem algum tipo de Educação Sexual segundo esta concepção, esta teria as seguintes características:
- Deve ser ação restrita à família e/ou estabelecida pela orientação de conselheiros espirituais.
- O fundamento é exclusivamente religioso e moral, tendo como tema único a reprodução humana, sendo introduzido por informações sobre reprodução vegetal e animal.
- Deve ser realizada um pouco antes da puberdade.


TÉCNICO-INTUITIVO E/OU SANITÁRIO
Constitui-se numa fase evolutiva da concepção anterior. A base fundamental, moral não é claramente expressa, porém apóia-se em conhecimentos científicos-médicos e segue uma linha normativa moralizante.
A Sexualidade é concebida como uma função bio-fisiológica e com tal deve ser conhecida.
Principais características:
- Interesse e curiosidade sobre temas sexuais porém revestidos de ansiedade, medo, culpa, ou seja,envolvidos por cargas emotivas altamente significativas.
- Fuga ao tema através de expressões alusivas, sarcasmos e gozações anedóticas.
- Posturas doutorais normativas: ligações, preleções, julgamentos, orientações valorativas e normativas morais
- Mensagem implícita de que a Sexualidade é tema clandestino, delicado, sinistro, vergonhoso, “algo proibido”.
- Não admite a manifestação da Sexualidade. Estabelece normas, inculca princípios sólidos. Aconselha, orienta e dirige. Apela para a saúde, para a religião, para o moral. Sempre sob uma visão negativa da Sexualidade.
Em nome d ciência mantém o esquema proibitivo, favorecendo inclusive a ignorância, ao reduzir a informação ao campo biológico.

MODELO DE EDUCAÇÃO SEXUAL
Há um desejo expresso no que se refere à implantação da Educação Sexual, no entanto, há verdadeiro terror e pânico “por medo do que possa ocorrer”.
Atribui-se ao especialista (geralmente o médico) a realização de conferências informativas técnicas, particularmente do tipo anatômico-fisiológico. Atualmente, por razões óbvias, inclui-se com bastante freqüência o tema AIDS.
A faixa etária a quem mais se dirige essa ação continua sendo a pré-puberdade (8 a 10 anos).
As pessoas tentem procurar solução para os seus problemas, sentem necessidade de Educação Sexual, mas são impedidas por atitudes proibitivas, pois sentem medo e vergonha. Sentem-se inseguras para expressar o que pensam, sentem e fazem em relação à Sexualidade, pois continuam considerando esse tema perigoso, delicado, vergonhoso e difícil, buscando orientação sempre no juízo de valores dos outros.


PSICOLÓGICA
Esta concepção é relevante pois busca o estudo e a compreensão dos processos complexos através dos quais o indivíduo desenvolve seus próprios valores e vai adquirindo sua maturidade pessoal e insiste no processo maturacional, devido ao qual o seu modo de ser, sua personalidade e a inter-relação dinâmica como meio. Nesta base estrutural maturativa insere a Sexualidade.
Considera a Sexualidade como uma pulsão que deve ser necessariamente integrada na personalidade de modo positivo, constituindo-se em um aspecto da afetividade da qual resulta totalmente impregnada.
Fundamenta-se no racionalismo científico, e tem como base os estudos psicanalíticos.
Principais características:
- Reconhece-se, em parte, a importância da Sexualidade.
- Constitui-se uma postura freqüente entre as pessoas “cultivadas”.
- Assume o falso silêncio e neutralidade.
- Aceitam em princípio, a Educação Sexual mas não fazem nada para desenvolvê-la.

MODELO DE EDUCAÇÃO SEXUAL
Atribuem a responsabilidade da Educação Sexual às pessoas vinculadas à educação global da criança, particularmente os pais.
As duas últimas concepções apresentadas, embora reflitam uma certa evolução, não apresentam mudanças reais e desejáveis.



CONCEPÇÕES PERMISSIVAS


A onda de permissividade com relação a Sexualidade, não alterou em fundamento no que se refere à assimilação do valor da Sexualidade Humana, na realidade, houve apenas uma troca de postura do “é proibido para o agora é permitido”. As pessoas que se crêem liberadas pelo fato de que agora podem falar pensar, dizer o que antes era proibido. No entanto, a Sexualidade continua sendo um tabu embora menor, um vício embora menor, uma grosseria que já não escandalizava tanto. Tais comportamentos são caracterizados pela oposição e não pela conscientização: “não se sabe muito bem porque se permitir”, porque “não se deve proibir”. No fundo, continua a mesma concepção de dever, obrigação, norma, ou seja, imposição. Isto significa dizer que, a mudança de atitudes não se verificou do negativo para o positivo. Mas, quando muito do negativo para o menos negativo.


CONTESTÁRIA
Apresenta-se em oposição a moral sexual tradicional. Seus partidários buscam revalorizar a vida sexual, por meio da aquisição de valores e atitudes corretas, novos papéis sexuais e novas pautas de comportamento em oposição ou contra todo o tradicional.
Não há uma concepção clara sobre a Sexualidade Humana. Os partidários desta postura buscam mais descrever o que entendem por Sexualidade positiva, por meio da apresentação do que “deve ser permitido”, do que “não está proibido”, invés de explicar ou conceituar a Sexualidade. E, aqueles que tentam fazê-lo, apresentam quase sempre uma concepção reducionista fisiológica, corpo-orgasmo. Principal teórico: W. Reich
Essa postura origina-se em duas correntes teórico/filosóficas: Orientações Psicanalistas e Princípios Marxistas.
Há uma clara evidência da associação entre a liberação sexual e a liberação política.
O discurso se fundamenta nas contribuições oferecidas pela Psicanálise no campo da Sexualidade Humana e propõe uma revolução transformadora dos costumes sexuais e sociais (práxis marxista) visando as citadas liberações, para o bem da coletividade.
Principais características:
- Romperam a moral tradicional, liberando-se dela através do ativismo político.
- Contribuíram de forma decisiva para a mudança de costumes em matéria sexual.
- Luta reivindicatória para trocar os esquemas antigos por novos.
- Assumem essa postura para seguir a moda, para não ficar para trás.
- Mudam os critérios e princípios anteriores por medo de fazerem o “ridículo”. Por vergonha de não serem chamados “quadrados”. Essas atitudes não caracterizam mudanças reais, mas sim, expressam uma necessidade de aceitação, uma busca de uma nova forma de viver e como as anteriores tão pouco resistem à pressões.
É uma reação por sistema e no fundo, a postura continua a ser dogmática, moral e doutrinária.
Se antes havia a Educação Sexual, agora se tem a Deseducação Sexual.

MODELO DE EDUCAÇÃO SEXUAL
Duas características básicas:
1- Deve ser desenvolvida desde o nascimento.
2- Deve ser promovida por agentes educativos especializados.


CONSUMISTA
Trata-se de uma visão conceitual oriunda da postura anteriormente exposta, que passou a se constituir em um “filão de ouro” dos meios de comunicação social, em seu aspecto publicitário. Sua forma é importante na medida que uso o apelo sexual, erótico para a venda de produtos, no que resulta eficaz, e estabelece a formação de atitudes permissivas sem outras implicações científicas e pedagógicas, o que é no mínimo, irresponsável e manipulador.
Consiste em uma concepção mecanicista, tecnificada e consumista da Sexualidade Humana. Concebe o orgasmo como o deus supremo da Sexualidade e utiliza a mulher como o símbolo erótico associado aos bens de consumo.
Principais características:
- Promove o corpo como máquina do prazer.
- Supervaloriza o orgasmo como centro único da Sexualidade Humana.
- Estabelece o critério de êxito e felicidade sexual com base na quantidade (de orgasmo, evidentemente) em detrimento da qualidade.
- De assexuada a mulher passa a ser objeto de/ símbolo do prazer.

MODELO DE EDUCAÇÃO SEXUAL
Em realidade, não existe um modelo de Educação Sexual, apenas um processo informal de informação sexual.
A concepção de Sexualidade Humana assim como seu respectivo modelo de Educação Sexual não contribui positivamente nem para uma concepção correta (nível conceitual), nem para uma formação conscientizadora de natureza existente (nível educacional), e, consequentemente, nem para uma vivência positiva da Sexualidade Humana (nível vivencial)



CONCEPÇÃO RELACIONAL

A concepção relacional consiste em assumir a Sexualidade Humana como uma dimensão de pessoa, portanto como algo natural, sem “deveres” de proibição e/ou permissão. Reconhecendo que a Sexualidade propicia o prazer, promove a relação e a convivência.
A concepção de Sexualidade fundamenta em princípios:
1- Toda pessoa humana é sexuada. Este é um valor, uma dimensão humana que não tem porque ser discutido ou julgado, e sim admitido.
2- O fato de ser sexuado radica na potencialidade de ser homem ou mulher com as implicações que isto traz consigo.
3- Essa potencialidade deve ser cultivada, ou seja, cultivar-se como homem ou mulher significa potenciar-se como ser sexual masculino ou feminino. E cultivar-se é viver e expressar-se como sexuado.
4- A Sexualidade tem dimensões e funções.
A base teórica fundamental desta postura é a Sexologia, enquanto Ciência Humana que estuda o fato sexual.
No aspecto filosófico podemos encontrar princípios do Personalismo Humanista, na medida que o processo de sexualização é um processo vertical onde, a pessoa vai cultivando sua Sexualidade de forma consciente, autêntica e responsável.
Principais características:
Consiste em viver o fato de ser sexuado com suas implicações, mas como uma dimensão da pessoa humana que vale a pena suscitar, promover e cultivar.
Compreender que a Sexualidade cultivada leva a uma qualidade de vida humanizada e em conseqüência mais equilibrada, agradável e feliz.
Não aceita julgamentos, qualificação ou juízos de valor, procura explorar e descobrir ou redescobrir uma dimensão natural, inerente ao ser humano.
Procura, cada vez mais, estudar, conhecer, explicar em que consiste a dinâmica e os processos da Sexualidade Humana, objetivando potenciar o ser humano enquanto ser sexuado. Ou seja, opta pelo conhecimento ao invés do julgamento e da norma.
Assume o corpo como parte da unidade pessoa, reavaliando as sensações provenientes do mesmo como meio positivo de relação e comunicação.

MODELO DE EDUCAÇÃO SEXUAL
· Reconhecer a importância e necessidade imprescindível da Educação Sexual, considerando que essa dimensão do indivíduo, como qualquer outra, deve ser estudada, conhecida, assimilada, integrada e bem vivida.
· Inicia-se com o nascimento e prolonga-se por toda vida, acompanhando e adequando-se ao processo de desenvolvimento individual.
· É da responsabilidade de todas as instâncias implicações na Educação Global do indivíduo, particularmente e a escola e a família.
· Além de transmitir a informação rigorosamente científica, sobretudo fomente atitudes positivas em relação a uma dimensão (sexual) que é constitutiva do ser, e que, portanto, é necessariamente vivida. O que, possibilita comportamentos baseados no respeito a si próprio e ao outro, na responsabilidade pela conduta sexual e na capacidade de realizar escolhas livres, conscientes e autênticas.
· Compreende que a Educação Sexual, se não a única, é a principal forma de possibilitar uma mudança de atitudes: da proibição e permissividade para aquela desejável de cultivo.



Fonte: Material ISOF – Jeruza Maria Figueirêdo Neto – PhD

Nenhum comentário:

Postar um comentário